segunda-feira, 28 de novembro de 2016

Moacy Cirne - Rio Vermelho: tudo deságua na origem

Capa: Marcelo Mariz

Rio Vermelho (Fundação José Augusto/Departamento Estadual de Imprensa, Natal - RN, 1998) é um canal ficcional, pelo qual escorrem os três grandes rios ( Seridó, Potengi e Carioca), pertencentes à geografia afetiva, do também estudioso de quadrinhos, que desembocam diretamente no Itans, açude pertencente ao município de Caicó-RN, representando, nesse contexto, a própria poética do autor, um inicio de vivências e a finalização delas. E, por que não pensar nesse açude como uma departamento da memória daquele que, em sua obra, sempre enaltece suas raízes e junta a elas as novas aquisições (natalenses e fluminenses)? É tudo isso e mais um pouco.


É uma mistura, um sumo e ele nos refresca, ao longo do livro, com um tom descontraído, na maioria das vezes, regando a nossa fuga da aridez dos dias que não respeitam fronteiras, mas também é um lembrete de que "as fugas" não silenciam os gritos dos lugares que nos habitam. Dessa forma, os delírios com Ava Gardner num "calor dos seiscentos mil diabos" ou o "Cinema Pax" podem ser evocados num bar da Lapa, ou no Beco da Lama, em Natal. O certo mesmo é que esses lugares propícios para "reavivar memórias", nunca deixaram de existir na/(o) Caicó/ Seridó de Moacy. E as peculiaridades e semelhanças dessa geografia jamais vão se separar daqueles que se permitirem à leitura desse mundo.

Mais sobre Moacy Cirne você pode ver clicando aqui.

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Poemas do Rio Vermelho (1998)

RIO SERIDÓ


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Criança,
sol de rachar o quengo de qualquer vivente,
minhas admirações afetivas
multiplicavam-se
em cada sonho em cada viagem
em cada esquina:
Tarzan Capitão Marvel
Flash Gordon Durango Kid
Gracinha Esther Williams
Monsenhor Walfredo Padre Agripino
Carlitos Castilho
Píndaro Pinheiro Telê e Tio Silvino
meu pai meu avô
minha mãe.

***

Em caicó,
mel e rapadura,
apaixonei-me por Ava Gardner
por Brigitte Bardot
por Gilda, a que nunca houve.
Em Caicó,
mel e puxa-puxa,
o mundo e o fluminense nasceram
para mim.
E eu ainda não conhecia Nevers.

***

Um calor dos seiscentos mil diabos
fervia
as minhas fantasias com Ava Gardner.

***

Como seria o sabor
de morango?
seria doce-aurora como o de pinha?
Ou doce-crepúsculo como o de manga?
Sua pele encarnada
ocultaria algum segredo violeta,
algum mistério verde-musgo?
Afinal afinal,
como seria o sabor de morango?

***

Caicó
Caicó
      serra
      serrote
      solidão aridez
e um
     sorvete  de baunilha

***

Colecionei gibis, fotogramas
e estampas
eu
calol. Colecionei
espantos, devaneios e paixões
platônicas.
À distância,
                 a cidade caicó sertão seridÓ
uma história que não acabou
                 para os colecionadores
                 de sonhos
                 ambrosias
                 e chocolates.

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RIO POTENGI


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Natal Natal:
um Potengi e seus crepúsculos
dois filmes aos domingos
e todas as mulheres do Argèpe.
Natal Natal:
uma Ribeira e seus jornais
dois livros de Camus
e todas as nereidas de Areia Preta.

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              aleglórias
              alegorias
da casa de
Sanderson
              navios cochilavam horizontes.
              Dailor
              e Miguel Cirilo
              desenhavam silêncios
              e tangerinas.
              na Ribeira
              Berilo Nei Leandro
              e Newton Navarro
              plantavam poesia
              e pitombas.

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Como
era
mesmo
o
nome
daquela
                rapariga
que me anoitecia de carnes e espantos?

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feira cordel sarapetel
bairro cidade novidade
o Alecrim
                pátria
do São Luiz
e
de
José Bezerra Gomes,
                               o poeta
                               que
                               naquele sábado

***

Forte dos Reis Magos
Igreja do galo
beco da Quarentena
que seus heróis
                santos
                putas e bêbados
                orem por nós,
                amém.

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RIO CARIOCA

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